terça-feira, 13 de agosto de 2013

Trilho

Ah, essas conversas madrugadas adentro
tão concentradas em algum sentimento
o telefone na mão
até o sono chegar.

O trem está passando, Mel,
escute
já está tarde
vamos dormir.

Ah, essas conversas madrugadas adentro
tão concentradas em algum sentimento
o telefone na mão
até o sono chegar.

O trem está passando
talvez me leve aí pra perto
ou te traga
quando eu acordar
e tudo o resto
vai começar a fazer sentido.

sábado, 22 de junho de 2013

CID: C34.9

Já não tens o tempo
que tu tinhas antes
teu corpo que se arrasta
de maneira arquejante
tua dentadura gasta.

Já não aguentas muito esforço
teus movimentos hesitantes
tua voz anda tão fraca
e o que outrora foi teu semblante
agora é uma imagem opaca.

Mas teus olhos ainda são brilhantes
Como fogueira, e não fagulha
força que corre, de forma constante
Em tuas veias marcadas de agulhas.

(mas a cada vez dormes mais e mais
tanto que um dia
não irás acordar)

Já não tens o tempo
que tu tinhas antes.

Acorda, vô,
sua transfusão de sangue
já acabou.

sábado, 15 de junho de 2013

Interfone

Como vai?
Tu ainda escreve
aqueles poemas soturnos
à noite?

Conte-me sobre
seus fracassos
e vitórias
suas quedas
e vanglórias.

Como vai?
Tu ainda bebe
ouvindo canções do Lupicínio
à noite?

Deixe-me entrar
atenda ao telefone
só não me deixe aqui fritando
em frente ao interfone.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Queda n° 15

banheiro
luz apagada

tudo passa
em minha cabeça
tudo passa
principalmente
o que não quero

histórias de medo e solidão
dessa minha morte
que não termina nunca.

Madrugada

juntando pedaços de mim
tentando aliviar esta dor

a síndrome
a febre
o tumor

poemas tirados das tripas
palavra vomitada na flor.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

O pior

eis a mesa
as garrafas
o incensário
meus cotovelos
eis a janela
e o vento frio
do fim da tarde

um pardal entra voando
bate no teto
e nas paredes
e vai embora

eis minhas vísceras
assim expostas
dilaceradas
estranhas
eis minhas entranhas
eis o que arranha
minha pele
e a perfura
e não há cura

os desvalidos
solitários
alcoólatras
poetas da sarjeta
noturnos andarilhos
os mal-amados
suicidas
rejeitados
loucos
todos
todos
todos
são meus.

sábado, 13 de abril de 2013

Corte

declare ausência
faça falta
fique distante
minha decadência

esqueça a aparência
apague a memória
esqueça a história
apague a evidência

declare ausência
que uma hora
não vai doer mais

declare ausência
que uma hora
deixa de fazer falta

e uma hora
deixa de fazer falta.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Lítio

Bem que tu poderia
aparecer agora
saindo do trabalho
advinhando minha mesa
sonolenta do remédio

Bem que tu poderia
aparecer agora
por acaso,
ao trocar o caminho
numa rua
de prédios neoclássicos
e paralelepídedos

comprando cigarros
chegando mais cedo
talvez irreconhecível

embora eu não queira
bem que tu poderia
aparecer agora.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

O medo

tarde demais
ou tão cedo
o velho receio
o medo

todos os meus suicídios
empecilhos
martírios
fracassos

tarde demais
ou tão cedo
o velho receio
o medo

todos os meus atrasos
vôos rasos
acasos
e afins

tarde demais
ou tão cedo
o velho receio
o medo

todos meus porres
tarde demais
ou tão cedo
todas minhas mortes
tarde demais
ou tão cedo
todas as dores
tão tarde
tão cedo
tudo agora
no tempo certo
ou errado
em mim.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Ferrão


Sou tempestade em tua boca
a enchente
o terremoto
o vulcão

torcendo
para que não acabe
pedindo bis

Fiz tempestade em tua boca
a torrente
o maremoto
o furacão

querendo
que não desabe
(desejos juvenis)

Fui tempestade em tua boca
e no teu corpo
o acidente
o devoto
o escorpião.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Covarde

então me afasto
mas não é fácil
toda a dor
todo dia
vertida de dentro
trazida à tona

fluxo retido
represa rompida.

Sui Generis

Prepare a cama para dois
tomemos sopa com pimenta
é fim de tarde

Prepare a cama para dois
beije-me como a um estranho
estamos altos

Prepare a cama para dois
não nos veremos de novo
disso eu sei

Prepare a cama para dois
e depois de tudo
deixe-me aqui
dobrado sobre mim mesmo
as tripas revirando
chamando teu nome
eco sem volta.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Sábado

Então alguém
num vaivém
vai te encontrar

Quando ninguém
te queira bem,
se acostumar

Sendo refém
de quem recém
apareceu

E com desdém
e num porém
vai te encontrar

E num também
se obtém
o acalentar

E desse trem
(como convém)
te abandonar.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

10X0

Foi-se
num delírio de ácido

Foi-se
após o sexo
feito briga de faca
o sangue
o mênstruo
a foice.

sábado, 12 de janeiro de 2013

Coma n° 8

Cansado de tudo
acordando na maca
a fria manhã

Não me reconheço

Cansado de tudo
o recomeço
agora eu pereço
agora sou mudo.